Aquecimento - Interpretação de texto

Fala, galera!

Hoje trouxe uma ideia para começar uma aula descontraída. A musica em questão, da Pitty, é um exemplo de como o conhecimento de mundo é importante para a interpretação de um texto. Vale lembrar que esse é apenas um caminho para a interpretação e sempre cabem outros. Fiquem à vontade para opinar. 


Fracasso - Pitty





O êxito tem vários pais
Órfão é o seu revés
"Aos que sofrem, por fim o céu"
Abranda a raiva

O que trago sobre os ombros é meu e é só meu
Sustento sem implorar a benção e o pesar
Mais vil é desdenhar do que não se pode ter

Vive tão disperso, olha pros lados demais
Não vê que o futuro é você quem faz
Porque o fracasso lhe subiu a cabeça

Atribui ao outro a culpa por não ter mais
Declara as uvas verdes, mas não fica em paz
Porque o fracasso lhe subiu a cabeça

O maestro bem falou
A ofensa é pessoal
Quem aponta o traidor
É quem foi traído

Já sabe o que é cair, ao menos tentou ficar de pé
E, vítima de si, despreza o que nunca vai ter
O mais verde é sempre além do que se pode ter

Vive tão disperso, olha pros lados demais
Não vê que o futuro é você quem faz
Porque o fracasso lhe subiu a cabeça

Atribui ao outro a culpa por não ter mais
Declara as uvas verdes, mas não fica em paz
Porque o fracasso lhe subiu a cabeça




Antes de iniciarmos a análise da letra "Fracasso", vale ressaltar que a cantora baiana costuma inspira-se em grandes obras da literatura para compor seus discos. Seu primeiro Álbum, "Admirável Chip Novo", foi inspirado no livro de Aldous Huxley, um dos seus escritores favoritos. Há uma faixa no disco com o nome, na qual ela prevê um mundo robotizado - "Pane no sistema, alguém me desconfigurou/ Aonde estão meus olhos de robô?". Essa é realmente outra música que vale a pena trabalhar com os alunos, mas, para não me prolongar demais, vamos continuar... Thomas Hobbes é homenageado em outra música do disco: "Lobo" - "O homem é o lobo do homem". Um conto de Edgar Ala Poe, sobre a possibilidade de se fazer para o tempo é o ponto de partida de "Temporal" - "Chega simples como um temporal / parecia que ia durar".

Sugiro a exibição do clip da música e um debate depois sobre as possíveis interpretações e a quais obras a autora se refere.

a música fala basicamente da acomodação do ser humano, seja por medo ou por ignorância. Ele acostuma-se ao fracasso e prefere culpar aos outros por sua derrota a correr atrás do que desejam para si.

Na primeira estrofe percebo uma referência a um provérbio brasileiro bem conhecido: "filho feio não tem pai". Perceba "O êxito em vários pais, órfão é o seu revés". Então, se sou bem sucedido, devo isso ao meu esforço, mas se não o sou, a culpa é de outra pessoa." 

"Aos que sofrem, por fim o céu" é uma referência às bem-aventuranças do evangelho de Mateus, um texto bíblico - "bem-aventurados os que sofrem, porque deles é o reino dos céus", Pode-se perceber uma crítica àqueles que acreditam que seu sofrimento hoje valerá a pena quando morrerem e se conformam com a atual situação. A religião como forma de alienação. Bem, prefiro não me aprofundar muito nessas questões religiosas em sala, mas cada um conhece a turma que tem.

A segunda estrofe traz à tona uma imagem bíblica - "O que trago sobre os ombros é meu e é só meu" - a "cruz", ou seja, o sofrimento que carregamos.

Já no refrão alguns bordões bem conhecidos: "o futuro é você quem faz" e "o sucesso lhe subiu à cabeça", nesse caso, o fracasso. 

Na quarta, uma conhecida fábula de Édipo é mencionada: "A Raposa e as Uvas. " Nela, uma raposa, após inúmeras tentativas fracassadas de alcançar um cacho de uvas em uma videira, as declara verdes demais e que não valiam a pena. Ela não consegue aceitar sua limitação e perde a oportunidade de evoluir, de aprender algo.

Na quinta estrofe uma menção a Tom Jobim, o maestro do qual ela fala, que ficou para a história: "No Brasil, fazer sucesso é ofensa pessoal."

Cabem nesse texto muitas leituras. O que gosto de enfatizar é a importância do conhecimento de mundo no momento da interpretação. Quanto mais lemos, mais fácil torna-se o processo.

Proponho, por último uma análise do clip da música: o clima obscuro, a aparência da cantora/personagem que se alterna entre bem maquiada e totalmente borrada, desgrenhada, parecendo estar vestida para um enterro em alguns momentos.
As imagens se relacionam com a mensagem do texto? Como se dá o processo de composição de um clip? 

E que tal descobrir sugerindo aos alunos que façam os seus próprios com suas músicas ou com outras que eles curtam? Eu já fiz isso e ficou bem legal. Vejam:

Eduardo e Mônica - Legião Urbana




Até a próxima!

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